Entrevista com o Psicanalista Clay Nascimento


Conheci o psicólogo, neuropsicólogo e psicanalista Clay Nascimento por redes sociais e desde o primeiro contato desenvolvemos um bom vínculo. Sempre aberto ao diálogo e a transmissão, é uma pessoa bastante relevante na minha formação. Recentemente tivemos uma atividade relacionada ao tema da Covid-19 e eu, José Maria e meu amigo Fábio Louredo elaboramos algumas perguntas. Procurei fazer uma boa revisão após transcrever e deixar o texto o mais corrigido possível, porém há termos que fogem da minha realidade e podem não estar escritos da forma correta, peço a compreensão desde já.  A entrevista consta também no formato de áudio / podcast e iremos editar e publicar em um futuro breve. Acompanhe o Clay no Instagram clicando aqui 

Pergunta Introdutória: Como você se interessou pela Psicologia e qual abordagem você utiliza em seu trabalho?

Na época que eu comecei a me interessar pela área psicológica, eu fazia informática. Eu tava no quarto pro quinto semestre de sistemas de formação, a informática aqui na Bahia, né? Que aqui tem dois cursos específicos, que é ciências da computação e sistema de informação. A ciências da computação, ela é na área pública. E o sistema de informação, na particular. Quando eu fiz o vestibular, eu passei nas duas, tanto na pública, quanto na particular. Só que na hora que eu visitei as respectivas unidades, tanto a universidade, quanto a faculdade, eu vi que a faculdade particular realmente a estrutura era completamente diferente em termos de materiais, computadores e tudo mais. Então, optei por fazer, não era uma mensalidade cara, então optei pela particular. Sempre gostei de informática, de computação, essas coisas todas, só que eu me dei conta que meu gosto por isso era muito mais por uma questão de prazer pessoal, do que um prazer aliado a uma questão de trabalho. Eu percebia que sempre que eu tinha que trabalhar com informática pra alguém, pra ganhar dinheiro e tudo mais, aquilo me irritava. Lidar com a pessoa que precisava do serviço, era uma coisa complicada, uma grande maioria das vezes leigos e você tinha que explicar muita coisa que a pessoa não entendia e aquilo era um pouco ruim, não era uma coisa prazerosa e nessa época da faculdade de sistema de informação, eu já tava lendo Freud. Eu já tinha comprado a coleção toda de Freud, das obras de Freud e eu já fazia esse estudo, eu já fazia essa leitura porque particularmente eu gostava. Eu já me interessava muito pela psicanálise, sempre achei muito interessante… No quinto pro sexto semestre, eu decidi, de fato, abandonar o sistema de informação. Eu nem tranquei a faculdade, eu abandonei mesmo… E falei: “Vou fazer vestibular pra psicologia…” Porque eu sabia que dentro da psicologia era onde tinha a psicanálise. Então, quando eu entrei na psicologia, diferente da grande maioria que entra sem saber a abordagem, lá tem o conhecimento das abordagens, né? E depois de um tempo acaba optando, eu já entrei sabendo que eu queria psicanálise. Até porque eu já entrei com o conhecimento um pouco mais avançado da psicanálise. O que me ajudou bastante com relação ao decorrer do curso, porque disciplinas como psicopatologias um, dois, três, Psicossomática, a própria neuropsicologia… A base sempre vem da psicanálise, né? As psicopatologias, tudo vem muito da psicanálise, né? Então, eu não achei isso no behaviorismo quando eu estudei behaviorismo radical, não achei isso no TCC, que admite aí a existência do pensamento, da cognição, no próprio humanismo também não achei essa profundidade toda, de todas as abordagens que que eu conheci dentro da faculdade, pra mim a mais superficial foi, de fato, a TCC e o behaviorismo, né? É uma coisa muito, muito superficial mesmo, eu não consegui ir além, foi uma matéria, uma disciplina extremamente fácil pra mim, né? Tanto que a professora na época, ela achava que eu fosse de fato escolher, na cabeça dela eu era o pupilo e, na verdade, não era, eu simplesmente achava uma matéria muito fácil. Trabalhar com variáveis, mudar comportamentos, reforçar e por aí vai. Fazer a punição pra ver o que era que acontecia, se ensinava, se extinguir um comportamento, isso era muito fácil pra mim. Então, eu percebi que em termos de behaviorismo, ele funciona muito com animais de inteligência mais baixa, no sentido de não ter tanta complexidade do pensamento né? Então assim, pra seres humanos que tem uma intelectualidade menos avançada e um desejo intelectual realmente menos avançado nesse aspecto, eu percebo que o behaviorismo, ele funciona mais, é igual com cães… Os cães tem uma inteligência emocional muito bem trabalhada e tal, mas a complexidade do pensamento cognitivamente falando, eles não tem como seres humanos. E consequentemente a questão do condicionamento se dá de forma muito mais facilitada. E depois disso, conheci o humanismo, percebi que muitos alunos optam e optaram pelo humanismo por achar mais fácil, né? Quando não conhecem de fato a fenomenologia, quando não conhecem de fato, existencialismo profundo, quando não conhece de fato a Gestalt que utiliza também de aspecto de base humanista, mas utiliza a abordagem ACP, né? Abordagem centrada na pessoa. E fica uma coisa muito superficial também, por ser mais facilitada. Então, muitos alunos que tem dificuldade, tanto para a TCC, quanto para a psicanálise, que a maioria tem dificuldade pra psicanálise, porque de fato é a teoria dentro da psicologia mais profunda que existe. Mais densa, com a linguagem mais densa que existe e a única ali dentro que vai trabalhar com aspectos do inconsciente, todas as outras trabalham mais a nível do ego, a nível consciente…Então, mas ainda assim, a fenomenologia tem muitos aspectos que são bem semelhantes à psicanálise.  Não é tão profunda quanto a psicanálise, mas é bem semelhante alguns aspectos. Só que aí eu apenas confirmei que, de fato, eu queria e a psicanálise pra mim era a melhor abordagem. E, de fato, é a melhor abordagem… Eu recebi diversos pacientes dentro desses sete anos de clínica, que passaram por TCC e tal…com problemas de estresse pós-traumático…O famoso TEPT. E, inicialmente, até resolveu de forma rápida, mas no primeiro choque emocional que tinham, todos os sintomas voltavam e voltavam com extrema força… E aí, acabavam sendo encaminhados pra mim e a gente trabalhava a questão do tratamento através da psicanálise. Demorava mais, obviamente, mas quando chegava num conteúdo, de fato, patogênico, a catarse levava a uma, abre aspas, “cura”, fecha aspas. Esse sujeito ele aprendia a lidar com as situações, mesmo depois de novos choques emocionais, perdas, lutos e tudo mais, esses sintomas eles não retornavam mais porque de fato ele conseguiu ressignificar, não simplesmente mascarou com algum tipo de superficialidade de mecanismo de defesa utilizado por variáveis ou qualquer outra coisa. Então, de fato, a psicanálise, pra mim, é a mais profunda das abordagens dentro da psicologia. E foi assim que eu já comecei, dentro da psicanálise, só fiz confirmar isso no decorrer do curso. E é isso… A psicanálise pra mim é a teoria de abordagem psicológica, mais avançada e mais completa que existe de fato.

1 – Como você avalia o seu papel como psicólogo(a) nestes tempos de pandemia?

Extremamente importante e essencial. Muito, muito essencial mesmo. A necessidade é clara. Na verdade as patologias, as psicopatologias, elas já estão instaladas há muito tempo. Pacientes em potenciais, grande maioria, que não buscaram tratamento psicológico nunca na vida, ou se buscaram, fizeram uma ou duas sessões e abandonaram o processo, se tratando de Brasil, onde a psiquiatria é mais valorizada do que a psicologia, o que é de extrema burrice, na maioria dos casos, por quê? Primeiro, existe o desejo do imediatismo que o brasileiro tem, na verdade, pessoas mais leigas, pessoas menos intelectualizadas, infelizmente, tem essa ideia de imediatismo. Quer resolver a coisa da forma mais rápida possível e acha que existe remédio pra tudo e que droga pode resolver tudo. Hoje em dia é muito difícil algum psiquiatra fazer psicoterapia, apesar da classe médica brigar por essa questão, mas não é do desejo da psiquiatria. Se buscar aí cem psiquiatras, noventa e nove não vão fazer psicoterapia, não tem esse interesse, o interesse é ouvir o sintoma clínico do sujeito e passar o remédio pra controlar aquele sintoma. A ideia da psiquiatria é basicamente essa aí. Você vê um psiquiatra dentro de trinta, quarenta minutos dando um diagnóstico no sujeito, coisa que dentro de um processo de psicodiagnóstico, neuropsicodiagnóstico, nós levamos de seis a doze sessões com diversos instrumentos, além da observação clínica. Então, dentro da psicologia, a precisão diagnóstica é muito maior… Não têm o que discutir, mas o que é mais valorizado aqui no país é a psiquiatria, é a droga, é achar que a droga cura. É achar que existe mágica. Nada melhor do que o Farmacon, né? O tratar através da fala, através de uma análise com escuta treinada, obviamente. Né? O que difere muito de uma relação psicológica. A relação psicológica é a relação que você tem com qualquer pessoa. Você fala com seu porteiro, você fala com sua mãe, você fala com seus amigos, isso tudo é relação psicológica, mas a relação psicoterápica, a relação analítica, ela é uma relação treinada, de um sujeito que tem técnica. É um ouvido treinado, não é simplesmente uma conversa comum que você pode ter com qualquer pessoa. As intervenções, elas causam impacto e alterações e é isso que é importante, ninguém passa por uma análise sem ser afetado, seja em uma sessão, seja em duzentas. Ninguém passa sem ser afetado, vai sempre sofrer algum tipo de afeto.  Isso é fato. E esse afeto, ele pode causar diversas alterações positivas pro sujeito, né? Então, o papel do psicólogo, ele é extremamente importante e o que eu vejo dos meus pacientes é justamente essa demanda aumentando… Os sintomas ficaram mais intensos, as ansiedades latentes ficaram extremamente manifestas. As depressões aumentaram, todo tipo de transtorno, de sintoma psicológico, de psicopatologia, transtorno de personalidade. Transtorno de pecinético, tudo começou a aparecer com intensidade muito maior por causa da questão do isolamento social. Do despreparo do ser humano pra lidar com ele mesmo.  E não deveria ser assim, as pessoas deveriam saber lidar com a própria companhia e sentir prazer nisso, mas é o contrário, fogem do eu, fogem de toda forma possível desse eu.  É insuportável pra essas pessoas, pra grande maioria delas, lidar com o próprio eu. Então, busca um companheiro, buscam farra, buscam bebidas, buscam qualquer tipo de fuga da realidade, porque a realidade de fato é dolorosa, tá cada vez mais caótica e isso afeta de forma extremamente negativa, principalmente aqueles que não sabem lidar com sua própria existência…E como não existe tratamento, não se submetem ao tratamento, agora você percebe que os sintomas saem com mais intensidade. E, consequentemente, esses pacientes, eles buscam mais sessões, alguns até duas, três vezes na semana, coisa que era uma vez por semana e mesmo assim existiam semanas que justificavam a falta pra próxima semana e tal. Então, agora você tá vendo, a gente tá vendo aqui dentro do setting analítico, a busca por esse processo com muito mais intensidade.

2 – Cuidar dos cuidadores é importante. Como você como psicólogo(a) têm cuidado de seu psíquico neste tempo de pandemia?

Eu diria que o cuidado, no meu caso, ele veio de forma prévia, muito antes da pandemia. Eu fiquei quatro anos em análise. Foram quatro anos de um processo extremamente doloroso, mas extremamente libertador e de autoconhecimento muito, muito, muito f***… Desculpa o termo, desculpa a palavra, mas não tem como definir isso se não, utilizar desse conceito de palavra que a gente já conhece com intensidade bem brasileira mesmo. Então, realmente quatro anos de muito conhecimento sobre o meu eu, sobre os meus sintomas, sobre minha estrutura de personalidade, sobre meus próprios mecanismos de defesa. Sobre minhas pulsões a repetição. Tinha determinadas pulsões a repetição que eu repeti por anos sem me dar conta, e só em análise eu descobri esse padrão e pude alterá-lo. Então, eu me preparei, dentro desses quatro anos. Um outro aspecto que junto com esses quatro anos me fez me preparar pra esse tempo de pandemia, é a questão do aspecto de lidar com o próprio eu. Eu via na minha época de análise, que as pessoas continuam, continuavam naquela época, iguaizinhas a hoje, fugindo de uma relação consigo mesma… Buscando outras pessoas, buscando outros afazeres, buscando farra, drogas, bebidas, sexo, tudo pra ter que não lidar consigo… No meu caso não, eu sempre fui um cara que nesse aspecto, já facilitou um pouco mais minha vida. Enquanto que na minha na minha infância todos os primos cresciam juntos ali, tal, eu sempre fui mais isolado. Sempre fui mais da natureza, sempre morei em área rural, fazenda e tal e fui menos urbano… O restante da minha família era o contrário, eram mais urbanos e menos rurais, menos da fazenda, menos da natureza e mais da cidade. E eu percebo que quando você observa esse contexto de pandemia, quem mora em fazenda, quem vive em fazenda, quem vive em contato com a natureza, tem uma facilidade muito maior com a situação do que aqueles que vivem em cidade. Primeiro, quando se fala em isolamento social, “Ah, tem que ficar em casa, não pode ficar fora de casa…” Então, quem vive em fazenda não tem isso, eu moro em fazenda. Eu saio aqui a hora que eu quiser… Então, no tempo de pandemia eu saia aqui todos os dias, eu pedalo na fazenda aqui todos os dias, eu caminho na fazenda com os meus cães todos os dias. Então, é uma coisa que assim, dentro da cidade, você fica, de fato, preso a sua casa, na fazenda, não… na fazenda você não tá preso a sua casa, você tá livre… O ambiente é aberto, não tem pessoas… Você e pouquíssimos moradores dali da fazenda também… Então, até o contato é aquele contato, a vizinhança, a distância entre uma casa e outra, beira aí duzentos metros de distância. Então, é uma coisa muito, muito afastada… Então, não tem aquela necessidade, em ter um cuidado excessivo, preocupado, intenso, como dentro da cidade, que as casas são coladas umas nas outras e se você sair na janela, o vizinho pode tá na janela também e já é um perigo que se corre… Então, no meu caso, além do tempo de análise que eu fiz muito antes de pandemia, tem também essa questão do estilo de vida. E meu estilo de vida sempre foi um estilo de vida, menos urbano e mais da natureza. Então, quando todo mundo passou a entrar em quarentena, minha rotina não alterou muito, porque eu já vivo em quarentena… Eu só vou na cidade pra ir pro meu consultório pra atender ou em outras cidades aqui da região… Ilhéus, Itajuípe, Ibicaraí, saio daqui pra atender domiciliarmente. Tenho muitos pacientes em Ilhéus que sofreram assalto, tentativa de suicídio, desenvolveram neuropatias… Lesões, por lesões causadas por esses acidentes… E precisam desse atendimento domiciliar. E quando eu tava indo em Ilhéus, tava indo na cidade ou entrando aqui, até mesmo dentro da cidade de Itabuna, eu ia pra fazer esses atendimentos, ou no meu consultório, ou de forma domiciliar, ou até mesmo com alguma equipe “home care” também… Então, esse era o meu momento de acesso à cidade. Quando a coisa começou a ficar na quarentena, eu passei a continuar dentro da minha rotina, continuei indo pro consultório por um bom tempo, atendendo quem tava indo pro consultório e retornava pra minha casa… Retornava aqui pra fazenda pra viver normalmente. E isso não me afetou em absolutamente nada. Quando o pessoal começou a reclamar de estar em quarentena, de estar em casa, que isso era ruim, pra mim é bom… Então, assim, eu gosto de ficar na minha casa, eu gosto de tá em contato comigo mesmo, eu gosto de tá sozinho na natureza. Eu saio pra pedalar e pra caminhar, três horas da manhã, tudo escuro… Só ouvindo o som da natureza, sem ninguém falando por perto, ninguém, absolutamente ninguém e eu tenho um prazer imenso nisso… Então, meu contato com a natureza é um contato muito elevado. Então, enquanto todo mundo sofria por causa da quarentena, eu tava achando ótimo, porque minha rotina sempre foi essa, nunca mudou em absolutamente nada. E quando o sujeito, ele sabe, ele sabe lidar com ele mesmo, com a própria presença, você percebe que o nível de saúde mental desse sujeito é muito mais elevado. Quando você vê uma pessoa dependendo muito de companhias, de outras companhias humanas e tudo mais, quando você vê pessoas entrando muito em tédio quando estão sozinhas, é porque essas pessoas tem problemas com elas mesmas… Se ela tá entrando em tédio com a própria companhia, que tipo de companhia, ela é pra ela mesma? Eu não entro em tédio com minha companhia, eu gosto de tá sozinho, eu gosto de tá com meus bichos, com meu esporte, tanto que aqui na cidade tem diversos grupos de ciclismo e tal, não entro, eu prefiro pedalar e fazer meus esportes sozinho… Eu sempre fui assim. E depois da análise, isso se intensificou muito mais… Querendo ou não, um processo analítico, de fato, ele te desliga mais das emoções naturais da humanidade, né? Te afasta mais. Por isso que muitas pessoas acham: “Ah, psicanalistas são sujeitos frios…” Quem passa pela análise fica frio, não, na verdade fica mais reflexivo…Muito mais reflexivo que o normal, fica mais pensante e pensa sem o crivo da passionalidade, pensa com o crivo da intelectualidade… E consequentemente a razão tá muito mais acima da emoção… E você sabe definir o que você quer, o que você gosta e você faz sem problema nenhum. Se o outro tá incomodado com isso, se isso afeta o outro, a ponto do outro falar: “Ah… você é muito frio ou auto suficiente!”, isso é uma questão do outro… ele que leve pra análise dele, não é uma questão sua… Então, basicamente, no meu caso, continuo do mesmo jeito, com a mesma rotina e muito bem por sinal.

3 – Nunca se precisou tanto de psicólogos como neste tempo. Na sua opinião a profissão do psicólogo sairá mais fortalecida e valorizada depois da pandemia?

Olha, eu não sei afirmar se a profissão do psicólogo sairá mais valorizada depois da pandemia… Eu não sei afirmar isso por quê? É por causa da situação? Não, pela situação era pra sair extremamente valorizado. Você percebe uma busca muito maior por parte de todas as profissões de pessoas comuns. Médicos passaram a valorizar mais a psicologia, coisa que, na verdade, sempre viveram desprezando pela síndrome do “semi deus”. Então, sempre desprezaram muito essa área psicológica e hoje tão valorizando muito mais, porque tão vendo a própria necessidade, ao se darem conta que as suas drogas não estão funcionando como deveriam… Tanto que até mesmo numa estrutura psicótica. Você percebe que os antipsicóticos, eles servem pros sintomas positivos da doença, doo transtorno mental, eles servem pra esses sintomas positivos, que são as alucinações… as alucinações auditivas, visuais, que são as mais comuns que existem aí… Então, quanto aos sintomas negativos desse mesmo tipo de transtorno mental severo… uma esquizofrenia paranoide por exemplo… o sujeito ele pode parar de ouvir vozes que ameaçam ele,  mas ele não para de ter uma sensopercepção alterada, um delírio… Um pensamento alterado, de que outras pessoas podem estar falando dele, ele simplesmente para de ouvir as alucinações, eles param com esses sintomas positivos da esquizofrenia. Mas os sintomas negativos como a depressão, isolamento social, aquela coisa toda ali… O isolamento que é um sintoma colateral da negatividade aí dentro da esquizofrenia, não isolamento consciente que a gente tem que fazer pra se proteger de alguma coisa… Esse retraimento social, essa tristeza que abate o sujeito, os remédios não conseguem controlar, por mais que você coloque antidepressivos, ansiolíticos, os dois… Por mais avançados que sejam essas novas medicações, ainda assim não funcionam como deveriam funcionar e aí se mostra necessidade de uma análise, de uma psicoterapia… E aí os próprios médicos hoje tão buscando isso, outros profissionais da área tão buscando isso. Então, se fosse pela única situação… Pela situação que a gente tá vivendo, a psicologia sairia extremamente valorizada dentro de nossa realidade. E seria primeira profissão aí de maior valor… Porque sem saúde mental você não consegue executar absolutamente nada, você precisa primariamente de uma saúde mental pra você conseguir executar suas atividades com maestria. Quando você não tem uma boa saúde mental, você consequentemente acaba afetando todas as outras áreas… Então, sim… deveria sair valorizado. “Mas se você acha que vai sair valorizado Clay? Essa, essa área psicológica, você acha?!” Não sei… não sei porque nós estamos falando de Brasil, nós estamos falando de brasileiro, que se você for comparar o desenvolvimento humano do Brasil em termos de outros países, você vai perceber que o QI em outros países só faz aumentar, o do Brasil só faz cair, né? Então, você percebe que ao longo dos dez anos, a população brasileira, ela tá ficando mais burra do que o normal, ela tá ficando com QI mais reduzido do que o normal…Então, você avalia uma população dos Estados Unidos, Canadá, outros países, até alguns países subdesenvolvidos, você vai perceber que o QI tá aumentando, ou seja, as pessoas estão buscando mais educação de forma genuína, né? Não é simplesmente: “ah, eu tô estudando, quero um certificado e pronto…” Não…De fato, estudam mesmo e estão elevando isso. No Brasil não… dois por cento dos brasileiros tem nível superior, outros dois por cento tá entrando na faculdade, tão buscando isso, desses dois por cento que tão entrando na faculdade, você vai perceber que um e meio por cento quer  farra dentro da faculdade… Porque viu High School Musical ou porque viu alguns filmes que fala, que mostra que a faculdade é um antro de perdição, de sexo, drogas e rock and roll e por aí vai….e invés de buscar, de fato, um desenvolvimento dentro da faculdade, não, vamos pra curtir. Tem seus momentos de curtição? Óbvio! Lógico que tem… Mas é o mais importante? Não…. Você entra na faculdade, apesar de ser um efeito lateral você poder arrumar uma namorada, fazer boas amizades, curtir, sair, mas isso é o efeito colateral. O objetivo principal é aprender…Esse é o objetivo principal, o que muita gente acaba não entendendo… Já vi muita gente querer sair da faculdade porque perdeu o namoradinho dentro da faculdade, né? Já vi muita gente querer sair da faculdade, querer parar de estudar porque o melhor amigo cortou o laço ou então escolheu um outro melhor amigo e foi traído de alguma forma e por aí vai, né? Então, os seres humanos, eles são bem sensíveis. E quanto mais e ainda mais, quando não são tratados, se tornam ainda mais sensíveis. E é isso, né? Eu acho que se o brasileiro, ele não se conscientizar dessa mudança necessária no sentido de alteração, de uma elevação mesmo intelectualizada, de uma busca intelectual sublimatória até, né? Se ele não fizer isso, o que vai acontecer é que assim que a pandemia passe, assim que a pandemia passar… Se passar da forma como a gente imagina, pode perdurar alguma alteração por algum tempo, mas se não houver, de fato, o aprendizado, o que vai acontecer é: vai voltar tudo ao normal como era antes. A vivência, o mundo, não… os cuidados eles vão continuar, mas a cabeça, a psique das pessoas, elas vão ficar mais adoecidas, porém a importância que elas vão dar pras trivialidades vai voltar tudo como era antes, né? O que é trivial vai ter muito mais valor do que aquilo que deveria ter valor de fato… Então existe sim uma grande probabilidade da psicologia ganhar um valor só por algum tempo e depois desse tempo tudo ser esquecido, tudo voltar ao normal. Nós vemos isso com os próprios políticos, né? Você vê um monte de gente se conscientizando em relação a política e tal e depois de um tempo que volta os momentos ali das eleições e tudo mais, as pessoas esquecem e querem fazer as mesmas m***** de novo. Então, você percebe que parece que o brasileiro, ele não tem tanta memória assim, né? As pessoas não tem tanta memória assim. E acabam se esquecendo das coisas e deixando tudo voltar como era antes e repetem os mesmos erros, isso é uma necessidade muito grande de tratamento em massa, né? Você percebe, nesse momento, essa necessidade. Então, deveria sim sair pela situação muito mais valorizada, mas pelo nosso nível, em termos de totalidade, da população brasileira é bem capaz de que depois de algum tempo toda essa área psicológica perca novamente o valor, né? Tudo volte a ser na linguagem popular: “frescura”.

4 – Quais os efeitos psicológicos de um isolamento social tão inesperado para a mente das pessoas?

Os efeitos psicológicos pra um isolamento social não esperado pra essas pessoas, é devastador. É devastador porque o que você percebe é o seguinte: essas pessoas já estavam doentes, já eram pessoas previamente doentes, mas que essas doenças, esses sintomas, eram camuflados pela rotina…Era camuflado pelo trabalho, era camuflado por uma compra que ia ter que fazer, por uma saída com os amigos ali e acolá, né? Então, assim, tudo isso era muito camuflado. E agora, não…depois do isolamento social de forma brusca, sem ninguém esperar, a probabilidade desses sujeitos começarem a sintomatizar porque não restou mais nada pra camuflar, nenhum tipo de mecanismo de defesa, é muito mal elaborado por sinal, fica muito mais intenso, então os sintomas eles vem com mais força. Então, as pessoas que são mais sadias, vamos dizer assim, elas não apresentam tanto sintoma e consegue lidar melhor com a situação. E mesmo assim, mesmo essas sadias podem apresentar um grau um pouquinho mais elevado de cortisol, de estresse, pelo momento que se tá vivendo ali e tal, algum pico ali, de ansiedade, mas nada sério… Mas as pessoas que de fato já são adoecidas e não se davam conta disso, vão perceber muito mais. É por isso que a demanda, por busca e tratamento psicológico durante a pandemia, aumentou absurdamente, né? Aumentou absurdamente. Você percebe que o que não tinha tanto atendimento antes, que era a área online, né? O home office, passou a ter… e como eu acho que tem mais perguntas aí pra frente relacionado a essa questão do tratamento online, eu vou deixar pra responder aprofundamente nas próximas perguntas, mas isso é bem notório. A demanda aumentou muito, absurdamente… De você ter dias da semana que você atendia em uma cidade e atendia de manhã, de tarde e hoje você passa a semana toda atendendo e ainda lhe falta tempo. Atualmente eu tô atendendo até durante o sábado, até de noite… Coisa que não acontecia antes da pandemia. Então, você percebe que a demanda cresceu bastante, justamente porque as pessoas mais adoecidas, estão tendo que lidar com suas próprias patologias, seus próprios sintomas, coisa que antes não faziam, simplesmente ignoravam.

5 – Como os psicólogos podem ajudar os familiares a viverem a experiência do luto quando acometidos pela morte de um de seus familiares?

União… A melhor forma dos familiares que perdem algum membro, se ajudarem. União… Eles vão passar pela situação e dando apoio emocional uns aos outros, todos eles vão tá passando por um processo de luto, não é aquela coisa… todos vão ficar mal em um dia só, não é assim que acontece, um vai tá mais forte em um dia, o outro vai tá mais frágil em um dia. Aqueles que são mais fortes nesse dia, vai dar um apoio aquele que tá mais fraco. No dia seguinte, aquele que tá mais fraco pode tá mais forte e aquele que tava mais forte pode ficar mais fraco. É por isso que a união nesse momento pra dividir a dor ela é essencial. Até porque num processo de luto de agora, não é só o processo de luto que se enfrenta, se enfrenta um processo de luto e a dissipação do fantasma. Por quê? Porque a cultura sofreu uma cisão, dentro da cultura da gente, a gente tinha um ritual de velar o ente querido com os familiares e depois enterrar. Da forma como tá acontecendo agora, não tá acontecendo o velório, pouquíssimos familiares podem acompanhar o enterro, né? Por uma questão de segurança dentro da lógica da infectologia. Então, você percebe que com essa cisão dentro da cultura, desse ritual cultural que é natural pra gente, se instala um fantasma, aquela sensação de que morreu, mas não foi… Vulgarmente falando. Então, toda essa dissipação dessas dores vão ser… vai ser ajudada aí pelos membros em união… Já que não existe, nesse momento, a técnica entre os familiares, vai ser o apoio emocional, de fato, que vai suprir isso aí…

6 – Na sua opinião o seu consultório está sendo mais procurado depois da pandemia ou antes da pandemia?

Se eu for observar, pela pergunta aí, se o consultório está sendo mais procurado depois da pandemia ou antes dela… Observando o objeto consultório, antes era mais procurado, né? Por causa da pandemia, o objeto consultório ficou menos procurado, porém o setting analítico, seja ele lógico, físico ou virtual, ficou muito mais procurado. A demanda aumentou, absurdamente, mas o consultório físico, esse passou a ser menos procurado por uma questão de segurança… Isso é bem notório.

7 – Como a tecnologia têm sido útil na vida do psicólogo nesse tempo de pandemia?

A tecnologia tá sendo essencial nesse tempo de pandemia na vida do psicólogo. O psicólogo que não tem uma adequação, um conhecimento tecnológico, ele vai passar necessidade, ele vai ter sérios problemas. Hoje eu utilizo Whatsapp pra fazer atendimento. Eu utilizo outras plataformas como Skype, entre outras plataformas como Zoom pra fazer atendimentos. Eu faço atendimentos por chamada de vídeo, faço atendimentos por chamada de áudio, faço atendimentos pelo divã virtual através de gravações de áudio. Eu só evito os atendimentos por escrita, eu preciso da análise do discurso, então se o sujeito quer gravar um áudio, fique à vontade… Eu vou analisar o discurso dele, ele tem toda a liberdade pra gravar um áudio de quanto tempo quiser, eu vou analisar e a cada momento de intervenção, eu vou fazer intervenção. Então, pra psicanálise, o que interessa é a análise do discurso. Na neuropsicologia, que é uma especialidade que eu atuo também, não só análise do discurso é importante, como de fato, uma leitura corporal, é extremamente importante. Eu preciso fazer a leitura corporal e aí essencialmente eu preciso de uma chamada de vídeo. Mas se for apenas uma questão analítica mesmo, já o paciente já passou por uma consulta, já passou por uma anamnese e ali entrou no processo de análise, não preciso mais do vídeo, eu faço por uma análise do discurso, então eu adequei diversos tipos de instrumentos psicométricos pra aplicação online, já existem através da Vetor Editora, eu acho que a própria Pearlson também, que são plataformas que fabricam instrumentos, já existem aplicações online pra instrumento e diversos tipos de instrumentos, inclusive avaliação de personalidade e tudo mais. Então, adaptei diversas coisas. Eu faço, por exemplo, uma estimulação neurodinâmica com alguns pacientes, que é muito usado no neurofeedback também, com frequências em hertz, não interessa quais são as ondas, determinados casos, pra depressão pode ser um tipo de onda diferente de outra onda, pra ansiedade também, pra controle de dor crônica também, pra insônia, tratamento de insônia e por aí vai. Então, consegui adaptar isso também pra fazer uma aplicação online, a única exigência é que se tenha um fone de ouvido que seja interauricolar de ótima qualidade ou até mesmo um headphone que tenha  total redução de ruído. Porque isso aí vai ser essencial pra que o cérebro receba realmente as ondas sonoras a ponto de modular de acordo com as ondas que são emitidas ali. Então o psicólogo, o neuropsicólogo ele vai ter que de fato se adaptar as questões tecnológicas, sem a tecnologia ele não vai sair do lugar não….

8 – Você têm feito atendimentos online? 

Sim, tenho feito muito mais atendimentos online do que antes. Antes, eu tinha um paciente online e uns trinta, quarenta pacientes no presencial, contando consultório com domiciliar, os dois. Hoje, tenho mais de cinquenta pacientes online. Tanto que eu não tô atendendo apenas os pacientes aqui da região, eu atendo pacientes da região online, eu tô atendendo pacientes de São Paulo online, eu tô atendendo pacientes de Salvador, da Itália, de Portugal, brasileiros que estão lá. Então, eu tô atendendo em muitos locais. E aí nesse momento, você percebe a facilitação que a tecnologia traz pra esse tipo de procedimento. Mas aí, qual é a minha visão com relação a comparação entre atendimento online, atendimento presencial? O atendimento online funciona? Sim, funciona, sim, muito bem por sinal, muito mais do que o que eu esperava! Mas o atendimento presencial ele é melhor? Muito mais! Não tem nem comparação…O atendimento presencial, ele é muito melhor, muito mais aprofundado… E aí se eu for optar por um atendimento da forma de atendimento presencial, Clay? Qual é o melhor pra você? O atendimento do consultório ou atendimento domiciliar? O domiciliar! É muito mais aprofundado do que o do consultório. Porque o do consultório, o ambiente é meu…Eu arrumei o ambiente pra atender o paciente, mas o ambiente é formado para mim. Ele é configurado, o set up dele é pra o meu gosto. Ou seja, ali tem aspectos da minha personalidade. Quando você vai atender um paciente de forma domiciliar, a leitura ela é muito maior… E quem conhece aí a psicologia criminal, a psicologia forense, vai entender disso muito bem também, a própria psicanálise, que faz base pra psicologia criminal e a forense. Atualmente eu tô fazendo mestrado em psicologia criminal, com especialização em psicologia forense. E uma das coisas que deixa muito claro na questão do perfilhamento, da leitura do outro é o aspecto da psique… Os traços de personalidade que o sujeito ele deixa no seu ambiente. Então quando você vai fazer um atendimento domiciliar, a arrumação da casa, a escolha do cômodo, como está o cômodo que o sujeito escolheu pra ser atendido, como é que o sujeito vai estar…Os objetos que tem nesse cômodo, em que local ele senta ou deita. Perto de quais objetos ele fica, tudo isso é material para leitura, que foge, foge muito da capacidade do consultório. No consultório ele vai pra lá, você analisa ele, dentro da casa dele, você analisa ele, você analisa a casa, você coleta os dados da disponibilidade, dos traços de personalidade naquele ambiente, então a leitura presencial, domiciliar, ela é muito mais completa, inclusive, do que a leitura do consultório. Apesar de ser muito mais clássico a questão do atendimento do consultório.

9 – Qual sua visão diante dessa forma de atendimento perante o presencial? É uma mudança muito grande ou os pacientes conseguem ter um bom retorno com o atendimento online?

Os pacientes começam com mais dificuldade no atendimento online, eles começam com mais dificuldade, por exemplo, eu percebo que no atendimento do consultório presencial, é aquela coisa: o olhar do profissional, ele causa impacto. Mas o paciente já tá ali, eu acho que ele pensa daquela forma, já tô aqui, já tô sendo visto. Então, tem que falar. Então, cedo ou tarde, depois de um momento de rapport, ele acaba verbalizando como deveria. No atendimento online, não. Você percebe que a chamada de vídeo e observação é uma coisa que incomoda muito mais, tanto que depois de uma consulta, com a chamada de vídeo, eu paro de fazer a análise pela chamada de vídeo, porque eu percebo que os pacientes eles travam…Eu levo ele pra uma chamada de áudio ou até mesmo gravar livremente o que ele quer falar pelo áudio. E aí eu percebo que o aspecto inconsciente sai muito mais na gravação livre. Na verbalização sem estar sendo visto, tanto que eu chamei essa técnica de divã virtual. É aquela mesma coisa de quando você percebe que o paciente ele tá preso demais, sem conseguir, travado demais ali, você pega no consultório e fala: deixa eu te convidar ao divã aqui pra ver se você se sente mais a vontade e aí ele deita no divã, você fica trás, ele não tá te vendo e daqui a pouco você percebe que a verbalização tá saindo com mais fluidez. A mesma coisa acontece no atendimento online. O vídeo, ele causa um impacto maior por causa dessa questão do olhar. Quando você deixa a gravação livre, ele falar, utilizar somente a voz…Fica muito mais fluido que o normal. Ele começa a falar com mais facilidade, por não estar sendo visto. Então, ele fica mais a vontade pra isso. Inclusive, você percebe mais presença de atos falhos, de lapsos, de troca de palavras, tudo, dá pra perceber muito mais.

10 – Com a pandemia um novo conceito se criou um “novo normal”. Como você vê o papel do psicólogo no pós pandemia?

Papel do psicólogo no pós pandemia… tão essencial quanto durante e até mesmo antes da pandemia. Os sujeitos eles vão querer, inclusive, depois de algum tempo, aqueles que forem menos conscientizados, parar com o tratamento, depois da pandemia, tudo voltou ao normal, os novos, aqueles antigos mecanismos de defesa fajutos, não bem elaborados, como bebedeira, farra excessiva. Vão voltar tudo isso aí de novo, vai voltar tudo isso aí de novo, né? Com alguma segurança a mais ou até mesmo negligenciando algumas seguranças…Por achar que tá tudo tranquilo, parece que se esquece que existe o perigo ainda e aí vai fazendo a mesma m**** de novo, de sempre, né? Então, assim, o papel do psicólogo nesse pós, ele é essencial. Ele vai ter que fazer uma manutenção aí, vai ser uma manutenção agora, é óbvio que se por parte do sujeito, não há o desejo de continuidade de um tratamento em evolução, se perde o papel do psicólogo. É aquela coisa pra se dar uma análise, pra se dar uma psicoterapia, deve existir o desejo do sujeito, do paciente. Se o paciente demonstra ou não desejo, praticamente não há tratamento. Então, vai muito da conscientização, o papel do psicólogo, ele vai continuar sendo tão importante quanto, mas vai muito da conscientização do próprio paciente.

11 – Qual a importância da vivência da empatia nos tempos atuais?

A empatia, essa capacidade de se colocar no lugar do outro. De sentir em muitos momentos aquilo que o outro sente, é uma capacidade pra poucos. Muitos evitam e param de sentir, param de utilizar da empatia por uma questão de sintoma negativo. E tem aqueles que optam pela não empatia, pelo não sofrimento. Por uma escolha consciente de não se colocar no lugar do outro, para poder analisar o outro de forma mais racional. Em muitos momentos isso chega a ser mais importante, principalmente quando você tem um viés psicológico. Muitos profissionais quando utilizam da empatia, se colocam no lugar do outro, sente essa dor do outro, mas tem uma imensa dificuldade de se retirar daquela posição. É como se ele fosse fazer uma visita na casa de um paciente e ele vai fazer a visita, mas na hora de ir embora ele não consegue, é basicamente isso aí… Por mais empatia que exista, a distância ótima ela tem que tá presente. Porque você tem que ter essa facilidade de ir e vir, de se colocar no lugar do outro, de se retirar, por saber que o outro tem o seu lugar e ter esse lugar, é responsabilidade do outro, não sua. Então, muitos profissionais tem essa imensa dificuldade e acabam se afetando com isso e se afetam mesmo. De desenvolver, inclusive sintomas, porque, infelizmente, você vê uma gama de profissionais aí que não são tratados. Muitos profissionais formados, que estão atuando em clínica, não são tratados, não passaram pelo processo de análise, não passaram por um processo de psicoterapia, seja lá qual for a abordagem, não passaram por isso, simplesmente se formaram e começaram a atender. O que é um erro grotesco, mas acontece, acontece muito. Eu posso afirmar, inclusive, que tem muito menos profissionais atuando na área clínica tratados do que os não tratados. Esses profissionais que estão na área clínica atuando, que não são tratados ainda é maioria. É muito maior do que a classe que tá ali com a saúde mental bem tratada, vamos dizer assim, são bem analisados e tudo mais. Então, a empatia, ela é essencial, mas com esse controle. Saber que na hora de analisar, você tem que sair da empatia e usar a racionalidade. A empatia faz você perceber o lugar do outro e respeitar essa dor, mas a racionalidade é o que vai fazer você mover as intervenções certas. Porque pela empatia não vai sair certas intervenções, pelo contrário, você fica embargado pra fazer intervenção, você não consegue, porque o seu afeto tá ali, atravessando o que não deveria atravessar, né? Então, em termos de profissional, a empatia ela deve existir pra reconhecer essa dor do outro, mas ele tem que saber se retirar pra usar racionalidade, pra interpretar, fazer as intervenções sem elaborar pelo sujeito. A ideia não é explicar nada pra ele, porque senão ele não sai daquela posição, a ideia é fazer intervenção pra que ele possa ser implicado e possa ele mesmo começar a elaborar a própria situação pra levá-lo a uma ressignificação de um problema que ele possa estar vivendo ali. Então, empatia em excesso, ela é prejudicial para o profissional. E para outras pessoas também. Em excesso não vale, tudo tem que ser equilibrado, inclusive a própria distância ótima.

12- Deixe suas considerações finais e conselhos para os futuros profissionais da Psicologia que atualmente são estudantes.

Conselho que eu posso dar em termos de formação do profissional:  Busquem tratamento o quanto antes. Todos vocês… Busquem o tratamento o quanto antes. Se submetam a uma análise, se submetam a alguma psicoterapia e fiquem o tempo que for necessário. De preferência, depois de um tempo que sair da clínica profissionalizante, busque um profissional especializado, se submeta a um profissional especializado, eles vão tá mais aptos querendo ou não a uma análise mais profunda. Uma psicoterapia mais certeira, mais racional, mas técnica. Então, busquem esse tratamento, ele é essencial e pode ajudar bastante até mesmo na questão do manejo. Compartilhar uma experiência que eu tive lá, na minha formação da Clínica Profissionalizante. Eu, quando eu comecei a fazer a clínica profissionalizante com a supervisão psicanalítica, que é o tripé da psicanálise, né? O estudo psicanalítico, análise pessoal e a supervisão. Quando eu comecei fazer os atendimentos, eu percebia que eu tinha uma facilidade muito imensa de ser capturado pelo discurso da histeria, uma facilidade muito grande. Ali, minha supervisora percebeu a minha necessidade de tratamento psicológico e ela pegou e falou: “Você tá fazendo análise?”  Eu falei: “Não…”, “Vá fazer, porque você sendo capturado com muita facilidade pelo discurso da Histeria”. Eu: “Beleza”. Recomendou, passou a profissional, busquei o tratamento, comecei a me tratar. Inicialmente, quando a psicanalista virou pra mim e falou: “Qual o seu objetivo? Você veio por demanda espontânea?” Eu falei: “Não, na verdade eu vim porque a supervisora mandou, não tenho problema nenhum, né? Não tenho problema nenhum. Eu tô bem… Eu vim porque ela falou que eu fui capturado, que eu fui capturado muito fácil pelo discurso da histeria”. Nós sabemos que dentro do setting, a histeria, não só dentro do setting, como no mundo, o discurso histérico é aquele discurso de captura, né? Ele vai tentar capturar o outro sempre, vai tentar destituir esse outro de uma posição de mestre.  É natural que isso aconteça, é um sintoma da histeria. E consequentemente eu era facilmente capturado e assim eu falei, inicialmente meu tratamento dentro da análise foi justamente pra não ser captura pelo discurso da Histeria. O que era pra ser um tratamento de alguns meses pra aprender a não ser capturado pelo discurso da histeria, levou quatro anos. Em vez de ser alguns meses, levou quatro anos, “Mas levou quatro anos por que, Clay?” Porque eu percebi durante o processo que o meu problema de captura histérica, de ser capturado pelo discurso da histeria. Era uma pontinha de um problema muito maior… Que, de fato, era um problema de relação minha com a minha mãe, que, diga-se de passagem, é uma histérica, era uma histérica, já morreu recentemente. Mas era uma histérica, e eu era capturado pelo discurso da minha própria mãe. Em repetição com as histéricas que que rodeavam minha vida, inclusive as próprias pacientes. Então, eu tive que trabalhar muito isso, mas eu só me dei conta disso durante o tratamento. Então, assim, muita gente que tá aí formando, vai parar e pensar: “Ah, eu não tenho problema nenhum…” Como eu também pensei. Só que lá dentro da análise, quando a coisa começar a ficar mais aprofundada. Você vai começar a perceber que você tem mais problemas do que o que você imaginava. Eles podem ser inicialmente ou perceptivelmente assintomáticos, mas os sintomas estão ali. Você só não se dá de conta. Você só passa a se dar conta quando eles se tornam conscientes pra você. E pra eles se tornarem conscientes pra você. Você precisa da análise. Aí nesse caso é a análise mesmo. Não é outra psicoterapia não. É análise. Porque é essa que vai trazer o que está no inconsciente para o consciente. Então, se tratem, se tratem porque isso vai ajudar, inclusive, a vocês a serem profissionais melhores. Isso é um fato essencial que haja tratamento, você precisa, inclusive, pra evitar os efeitos contra transferenciais. Esses efeitos que o profissional pode sofrer, esses efeitos que o profissional pode sentir numa contratransferência com algum paciente que tenha uma história de vida ou algum tipo de sofrimento que você, profissional, se identifique. Então, tem que ficar bem atento com relação a isso aí. Então, é essencial que haja tratamento… O quanto antes.